O NOVO CORDEL
Nos últimos dias temos tratado de temas que visam suscitar a discussão sobre os novos rumos do cordel. As opiniões que aqui externamos passam por renovação da linguagem, dos conteúdos, o primado pela excelência na redação, etc... tudo visando a entrada da literatura de cordel nos círculos, digamos, mais exigentes da sociedade. Na última crônica chegamos a lançar uma espécie de desafio para que os cordelistas tratem em suas obras de assuntos ainda considerados delicados em certas esferas sociais, tais como homossexualidade, ideologia de gênero, política e outros que são ainda vistos como tabus pelos escritores de cordel. Nosso, por assim dizer, desafio não tem outra intenção a não ser a de tratar o cordel como literatura amadurecida, desvencilhada da aura de absoluta simplicidade e quase ingenuidade, abrindo suas cortinas para o mundo.
Confesso que a cada dia me surpreendo mais e mais com os rumos que a nossa literatura cordelista tem tomado nos últimos dias, porém não alcançando ainda o nível de amadurecimento de que tratamos no artigo do domingo a este anterior.
Temos acompanhado os movimentos que se dão Brasil em fora, os trabalhos individuais e toda espécie de acontecimento no gênero e isso vem nos deixando satisfeito, conduzindo-nos a reconhecer cada vez em escala mais crescente, o que já se pode denominar Novo Cordel. Vamos tentar situar o fenômeno ainda nos limites de tempo e espaço.
Aracaju, em Sergipe, foi palco na semana que ontem expirou de um acontecimento digno de nota, não uma singela nota de pé de página. A Rede Estadual de Leitura Inclusiva, durante a realização do seu IV Encontro contou com o lançamento de um Livro de Cordel que em suas páginas trata da situação das pessoas portadoras de deficiência visual, das instituições que as amparam e, ainda, discorre o livro sobre a vida e obra de Dorina Nowill, nascida no ano de 1920 do século passado e que, tendo sentido o problema na própria pele "fez da cegueira a sua lição de vida", para reproduzir "ipsis litteris" as palavras do cordel, que tratou de seu trabalho em prol da causa. À obra, com o título de A Rede de Leitura Inclusiva em Sergipe e tem como autores os cordelistas Ana de Araújo Reis e José Renilson Santana Lima soma-se o mérito de ser o primeiro cordel em braille de Sergipe, quiçá do Brasil.
Este registro tem por escopo mostrar os novos rumos do cordel, no quesito inovação de linguagem e conteúdo.
Aracaju não para por aí, e a 13° Primavera dos Museus que será realizada de 24 a 27 no Museu da Gente Sergipana terá no cordel uma de suas principais atrações, começando pelo dia da abertura quando será abordado o tema Nosso Cordel, Nosso Patrimônio, com palestras da professora Aglaê Fontes, presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe; Flávia Klausing Gervásio, do IPHAN e Izabel Nascimento, presidente da Academia Sergipana de Cordel. No dia 25, no sarau Primavera com Acessibilidade, haverá um recital de cordéis com crianças para público com deficiência, auxiliadas por educadores intérpretes de LIBRAS.
Como que fechando a semana anterior com chave de ouro, quero destacar a participação no dia de ontem do cordelista e professor Gilmar Ferreira no programa Para e Repara da Rádio Simão Dias FM 87.9, apresentado pelo radialista Elivânio Nunes. Durante duas horas, eu disse duas horas, o professor Gilmar que é também membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel - ABLC, discorreu sobre cordel e cultura popular de uma forma mais amplificada, mostrando assim o cabedal de conhecimento de que é portador. Parabéns a Gilmar e a todos da Simão Dias FM.
Por derradeiro quero registrar o Encontro de Cordel promovido pelo IPHAN/RN, reunindo intelectuais da UFRN, SESC, Secretarias de Cultura do Estado e do município de Natal. Na oportunidade a Estação do Cordel e a Academia dos Cordelistas do Rio Grande do Norte apresentaram uma carta com propostas que foram elaboradas pelos movimentos cordelianos no Brasil. O evento foi uma preparação para o Círculo Natalense de Cordel que acontecerá de 14 a 17 de novembro deste ano.
Autor: *Massilon Silva
* Escritor e poeta, membro da Academia Brasileira de Literatura de Cordel.